Quatro Luas

o outro lado do espelho da música da Europa. Domingos :22h-24h com repetição as quartas : 21h-23h, na AVEIRO FM 96.5

Minha foto
Nome:
Local: Aveiro, Portugal

quarta-feira, maio 30, 2007


Pimentola / Misantropolis ( Finlândia, 2007; Ed. Cold Meat Industry- Suécia, distr. Port. Equilibrium Music)


O retorno dos finlandeses Pimentola em 2007 reveste-se sobretudo do factor surpresa; se bem nos lembramos, no início do século distribuíram um cdr auto-financiado, onde se mostravam numa terra-de-ninguém estilística, soando simultaneamente a goth, folk sinfónico e metal nórdico. Nos anos seguintes surgem dois 7’’ e uma compilação de material perdido, onde a tendência era já ambiental mais obscura, embora com algumas malhas não muito estranhas ao dark-folk.
Com este novo “Misantropolis”, a tela muda – está-se perante uma máquina bem oleada de música cinematográfica, estranhamente reminiscente do expressionismo alemão, plena de referências pós-industriais, de desespero e paranóia lúmpen, mas sempre com um ingrediente especial que os distancia do batalhão escandinavo/germânico, habitualmente comandado pelos ensaios de nomes como Toroidh, Arditi, Stahlwerk 9, Deutsch Nepal, entre outros.
“Black Globe” e “Death is a secret” arrancam de facto “berlinenses”, como passagens secretas entre “O Anjo Azul” e os domínios do Dr Mabuse, que logo se dividem no labirinto da suite “Heart’s Dementia” (I e II) e na notável “Wish upon a Fallen Star”. A dinâmica “Psychopompos” restabelece o equilíbrio militar-industrial-épico, sendo um dos momentos altos do disco; até ao final, deparamos ainda com o fogo de barragem de “Wann endet die zeit?” e de “The stars hang like lamps from a sky of steel” antes de mais dois temas muito “Gabinete-do-dr-Caligari” (“Todessprache” e “Tuoni Pauloo tiukoin sitein”).
Misantropolis” é mais que um piscar de olho a Fritz Lang e ao cinema germânico da época Weimar– a entidade solitária que actualmente assume a manipulação maquinal (RM Salo) não anda longe dessas margens indutoras do desassossego (um pouco tal como os suecos Deutsch Nepal) só que mostra alguma “simpatia e bom-gosto” e, diga-se também, alguma filantropia, ao alertar-nos, pobres concidadãos europeus, para os perigos de vida na Misantropolis global. Mais um bravo para o batalhão pós-industrial.

domingo, maio 13, 2007

NURSE WITH WOUND, Auditório de Serralves, 5 de Maio de 2007

Balanço: Uma enfermeira ferida, mas fora de perigo, mantém audiência ligada às máquinas...


“No sense makes sense”- a citação mansoniana parece fazer sentido a propósito da vasta obra dos Nurse With Wound (NWW) de Steve Stapleton; só que o seu “no sense” ( que não é o mesmo que “nonsense”!) é meticulosamente encenado ou, quando improvisado, reflecte em exacta medida a prodigiosa criatividade do músico/não-músico britânico. Ver e ouvir os NWW de 2007, sabendo que só no ano passado Stapleton interrompeu um jejum de vinte anos em matéria de concertos, é mais que sorte, é deveras uma honra.
Incluído no programa “Anos 80, Lastro e Rasto”, paralelo à exposição “Anos 80, uma topologia”, com a coordenação da vertente musical da responsabilidade de Pedro Rocha, o concerto de Sábado, 5 de Maio, encheu o auditório de Serralves, numa paleta geracional “of sorts”- gente jovem e interessada, gente jovem e militante, gente menos jovem, resistente e sobrevivente da década que deu nome ao programa, todos na expectativa de presenciar e viver uma experiência sensorial única e inesquecível.
À frente, a toda a largura do palco, uma vasta mesa de conferência coberta de cetim negro – revisitar-se-ia o encontro fortuito de uma máquina de costura e um guarda-chuva sobre uma mesa de dissecação? Dissecação, sim, mas do som tornado puro, em última análise, abstracto. Que alinhamento mágico de estrelas se insinuava de fora para dentro da sala de Serralves?
Durante cerca de hora e meia, Steve Stapleton e os seus 3 actuais colaboradores, Matt Waldron, Marcus Ripley e o fundamental Andrew Liles, concederam-nos a possibilidade de fazer turismo espacial, sem pretensões pseudo-cósmicas, milionárias ou intelectualóides – e chega de se falar eternamente em Steve Reich, LaMonte Young, John Cage, Stockhausen; não foi em vão que, na alvorada dos 70’s, aos dezasseis anos, Steve foi passar “férias” para a Alemanha, em pleno “krautrock boom” - punkt! Em fundo, uma tela gigante com uma projecção vídeo conceptual, uma figura feminina asiática omnipresente em pose de deusa, com nus contorcendo-se à sua volta.
Após a meia hora inicial de voo no hiper-espaço do nosso córtex cerebral, o quarteto atrás das máquinas e gadgets vários, desliga o “warp-speed factor” e descansa em velocidade de cruzeiro, num inusitado “mutant space funk” tão livre e intensamente brilhante que não seria indigno dos momentos mais “funcadélicos” de SUN RA...Se calhar a atoarda do “alinhamento” estelar até que nem sai assim tão gratuita - não passavam exactamente sete anos sobre o ominoso alinhamento planetário de 5 de Maio de 2000 ?! Depois de alguns momentos francamente inesperados (embora já se soubesse há anos do interesse que Stapleton nutre pelo hiphop mais vintage...cf.“Rock’n’roll station”), a equipa regressa à vasta galáxia desse “hiperdélico dada”, que é transversal à já centesimal (!) discografia NWW. Mal se extingue o último “beam” sónico, o grupo abandona sob avalanche “himalaica” de aplausos que os ovaciona ininterruptamente durante largos minutos – imagine-se!: em Portugal pede-se “encore” num concerto de NWW! Ok, admitamos que é raro... Os músicos regressam, no seu bom humor, replicando: “Só mais 5 minutos, porque temos de ir para casa!”. É um grande final com antenas “theremin”, máscara anti-gás e batedeira-manual-para-claras-em-castelo, com guitarra eléctrica deitada sobre a mesa e arco de violino. Se foi esta a última vez que vimos Nurse With Wound, é mesmo para não esquecer – avisam-se os mais curiosos que os dois novos discos se chamam “Stereo wastelands” e “Insect and individual silenced”. NWW 1978-2007... ao cabo de 3 décadas de serviço, a Enfermeira Ferida merece a medalha de alto mérito e bravura, mas espera-se que não se reforme já...




Von Thronstahl : Sacrificare ( Alemanha, Abril 2007 / Fasci-Nation Recs./
Cd-box deluxe, distr. em Portugal :


Não é fácil caracterizar os alemães VON THRONSTAHL (VT); longe de soarem unidimensionais, saltam constantemente do folk pomposo para momentos épicos e marciais, ou então metamorfoseiam-se em andamentos repetitivos de glória industrial.
“Sacrificare” surge após um relativo hiato de 2 anos e meio, se considerarmos que “Pessoa/Cioran”, lançado pela sintrense Terra-Fria e a meias com o projecto irmão The Days of the Trumpet Call, no Verão de 2004, foi o seu último registo de estúdio. Para trás ficaram álbuns como “Imperium Internum”, “Bellum Sacrum Bellum” e “E Pluribus Unum”, para além de 7’’ e 10‘’ de edição muito limitada.
Poeticamente, Josef K e os seus confrades “reclamam-se” da alta tradição trovadoresca europeia, que tanto bebe influências em Wolfram von Eschenbach e Chrétien de
Troyes como em escritores-filósofos como Otto Rahn ou Oswald Spengler.
“The Age of Decay and DEMOCRAZY” é o santo-e-senha para o espírito de neo-misticismo cristão de feição guerreira que rege o novo VT – o escárnio do falhanço redondo da pseudo-nova-ordem europeia que os nossos domingueiros arlequins tanto gostam de apregoar.
Outros momentos como “Gloomy White Sunday”, “Occidental Identity” e “Mother of Mercy” (este último dedicado à Virgem Maria!...) reafirmam o leitmotiv neles sempre latente, o do puro saudosismo, eterno e saudável, para afastar o fantasma da morte cultural da Europa (a que assistimos diariamente via TV, através das bugigangas globais do pós-neo-liberalismo...). Se a estes acrescentarmos “Palästina”, “Berg-Einsamkeit” ou “The 4 horsemen of the Apokalypse”(com o incrível loop do tema homónimo dos Aphrodite’s Child, de Vangelis e D. Roussos!), então não será exagero resumir este disco como o mais brilhante e acessível na discografia dos Von Thronstahl – tal como os OSTARA de Richard Leviathan, os “fins justificam os meios”. Um disco que decerto marcará o resto de 2007.

quinta-feira, maio 03, 2007

http://lurkersrealm.blogspot.com/2007/04/entrevista-sangre-cavallum.html

"Excelente conversa proposta pelo Lurker's Realm aos Sangre Cavallum. Embora a maior parte das respostas não nos tenha apanhado de surpresa, " os melhores livros são aqueles que te dizem exactamente o que já sabias". Oxalá continuem assim por muitos anos! Quanto à banda propriamente dita, permanecem imperturbáveis, "cavalgando o tigre", donos e senhores do tal efeito "X" que passo a descrever : pega-se num disco SC ( de preferência vinil, mas pode também ser cd); coloca-se no prato ou na gaveta do cdp; se aos primeiros acordes começar a sentir um certo formigueiro na base do pescoço, resultando num indescritível mas estranhamente agradável estado de inquietação, então está no bom caminho e deve manter uma atenta audição dos próximos temas; se estiver a escutar vinil, vai de certeza chegar ao fim do lado A com uma incontrolável urgência de virar o disco; faça descer a agulha sobre o lado B e retome o ritual; se ainda não o registou durante a audição do lado A, é provável que comece agora a sentir o efeito atavístico cumulativo que se traduz pela indução espontânea de "insights" não identificadas que procedem directamente das memórias do sangue - feche os olhos e deixe que à sua frente desfilem e dancem todos os povos ancestrais a quem de facto deve alguma coisa de bom e eterno, e não aqueles com quem só aprendeu a manusear prata, ouro e diamantes (por muito que estes sejam eternos...esqueça Amsterdão!); é provável que sinta nos pés vontade também de dançar à roda, à roda, invocando bélicas deusas em cio, entre rios...; se, quase no fim da audição, começar a perder total noção do momento presente, então é voltar ao ponto de partida. Um dia a sua memória do sangue vai também ser memória de pedra e é bom que se habitue - escutar Sangre Cavallum é para já o melhor exercício que conheço. E já agora venha também viajar no Barco do Vinho!
JCSilva/QuatroLuas/AveiroFM96.5Mhz
www.aveirofm.net
Dom.22h/Qua.21h/
www.myspace.com/quatroluas