Quatro Luas

o outro lado do espelho da música da Europa. Domingos :22h-24h com repetição as quartas : 21h-23h, na AVEIRO FM 96.5

Minha foto
Nome:
Local: Aveiro, Portugal

sábado, março 31, 2007



Ianva - "Disobbedisco" ( Itália 2005-2006, ... )
A arte de recriar uma época ficou confinada ao cinema e, último reduto, ao texto literário. Contudo, alguns discos fazem mais pela evocação de um tempo que todo o guarda-roupa de La Féria ou as momices das estrelas residentes.
Caso genovês digno de estudo, o projecto Ianva (“Génova” em latim) repõe com imaginação e rigor os agitados dias italianos de entre 1918-20. Em “Disobbedisco”, álbum que sucede ao ep “La balatta dell' Ardito”, o fantasma de Gabriele d'Annunzio está por perto – o genial poeta militar fascio-futurista-e-tudo que tinha um barco na sua biblioteca e uma cama de dossel ornada com uma escultura marmórea de ninfa desnuda.
Os Ianva são provenientes de vários projectos musicais, de áreas tão díspares quanto o free-jazz, o dark-folk,o industrial e até black-metal! Mas juntos são exímios em reencarnar o garbo estético marcante dos primórdios da revolução nacional italiana. Entenda-se aqui o lado mais “refrescante” desse período, que se prendia entre outras coisas com o arrojo das ideias estéticas e a afirmação do futurismo como veículo “de anúncio” para uma nova era. As canções dos Ianva, sendo tradicionalistas, tipo orquestra grand-cabaret onde a secção de metais é poderosa, detêm esse magnetismo irresistível que mais tarde ou mais cedo os tornará emblemáticos da música italiana.

sexta-feira, março 30, 2007

ESTIVEMOS COM BOYD RICE, EM 24 SETEMBRO 2005, NA SUA PASSAGEM POR SINTRA, NA QUINTA DA REGALEIRA, QUANDO BOYD VEIO APRESENTAR O SEU LIVRO BOYD RICE:" THE VESSEL OF GOD" M. JANEIRO: "PORTO DO GRAAL" (TERRA-FRIA 2005)PASSAMOS A SEGUIR O RESULTADO, POR JOÃO CARLOS SILVA:

Na nossa conversa com Boyd Rice na esplanada jardim da Quinta da Regaleira, o autor de Children of the Black Sun confidenciou-nos que nunca tinha pensado, desde que iniciou a sua actividade de criador de paisagens sonoras em 1975, que alguma vez pudesse desenvolver uma carreira tão longa. O facto espanta-o mas considera que tem sido bastante positivo. De resto a recente compilação de 2004 “Terra incognita” constitui uma forma pouco ortodoxa de fazer uma retrospectiva, em que não só reúne os velhos temas com os novos, como também dá a conhecer a novos públicos alguns temas que sendo clássicos da sua carreira, acabam por aproximar o seu som dos seus contemporâneos dessa época. A ideia ocorreu-lhe quando foi convidado por uma rádio para fazer um pouco da história da música minimal repetitiva, electrónica e industrial, em que se ouviam coisas como Philip Glass, Kraftwerk, Suicide, etc. Eram os nomes que, entre muitos outros, na década de 70 começaram a fazer mais ou menos o mesmo tipo de música ao mesmo tempo. Boyd pensou que havia em stock muito material com o qual as pessoas na generalidade ainda não se tinham familiarizado; daí que tenha optado por uma retrospectiva tão heterodoxa como “Terra Incógnita – Ambient Works 1975 present”.Para além de ser uma forma de se apresentar a novos públicos, faz com que o seu ouvinte habitual descubra novas possibilidades. O futuro álbum de Boyd Rice de verá intitular-se “Man cannot flatter fate”, uma frase retirada da tragédia Édipo Rei, uma frase tremendamente sugestiva, se se pensar que termina “and punishment must follow.”, o que se aplica bem ao actual estado da humanidade neste planeta. Boyd espera que a distribuição da sua editora Mute records, sediada em Londres mas com escritórios em quase toda a União Europeia, continue eficaz, embora saiba que nalguns países europeus isso nem sempre se verifique.A rotina de trabalho de Boyd Rice, embora aparente alguma complexidade através dos seus discos, é na realidade bastante prática, já para não dizer simples. Fazendo justiça à área musical em que se insere, Boyd é um hábil coleccionador de sons, aqueles que acha deveras interessantes para incluir nos seus álbuns. Depois processa-os em estúdio, através da criação de loops, que podem ser alvo de gravação multi-pistas, com hipóteses múltiplas de processamento., garantindo aos sons de Boyd Rice uma permanente mutabilidade.Tudo isto é feito com notável rapidez, seguindo os mesmos passos de gravação que tem vindo a utilizar desde os 17 anos. É uma espécie de ofício que aprendeu por si próprio e que ainda hoje usa para garantir o seu mester. Basta-lhe dois padrões sonoros que se sobrepõe um ao outro, criando a ilusão auditiva no ouvinte de que existe um terceiro padrão, que na realidade não está lá, é criado pela percepção humana. Podemos entender os efeitos e possibilidades múltiplos se a partir de aí se passar ao processamento multi-pistas. Quanto à vida futura de um dos seus mais bem sucedidos projectos, o Wolfpact com Douglas Pearce dos Death in June e Albin Julius dos Der Blutharsch, Boyd Rice mostra-se bastante reticente; não que esteja pessimista, mas a distância que separa os três, no eixo Colorado-Áustria-Austrália, é um grande obstáculo. Para além disso, a carreira dos der Blutharsch vai de vento em popa na Europa, com um significativo número de concertos e gravação de álbuns consecutivos; por seu lado, Douglas P. prepara de momento o seu tão esperado novo de originais cujo material remonta na sua maioria a 1997, devendo tirar um ano de folga para concluir a auto-biografia Death in June, a que acresce a preparação de material vídeo. Mas mesmo assim, não recusa a hipótese de se encontrarem numa cidade qualquer e visitarem um estúdio para gravar qualquer material disponível. Quanto a Michael Moynihan dos Blood Áxis, outro colaborador de Boyd no histórico álbum de 90 “M+M+M”, a distância e o tempo serão também os principais inimigos, já que Moynihan vive no Oregon, na costa oeste. Mas Boyd remata que um dos planos para o Wolfpact será editarem em breve um best of com as melhores canções não só do projecto como também das restantes colaborações em Douglas, Albin Julius e o baterista dos Knifeladder John Murphy, entraram, caso do excelente trabalho de 95, sob o nome de Scorpion Wind, intitulado Heaven sent. Relativamente às reacções hostis que normalmente acontecem nalguns países que visita, a começar pelos próprios Estados Unidos, Boyd afirma que se dá ao trabalho de estabelecer conversação com as pessoas que se manifestam, procurando entender o porquê de tal comportamento. Regra geral descobre que ninguém sabe quem ele é nem que tipo de música faz ou quais são as suas directrizes estéticas essenciais. De resto Boyd relata um episódio que teve lugar em Los Angeles, à porta de um clube do Sunset Boulevard, em que se dirigiu à pequena multidão com cartazes e entoando palavras de ordem contra ele; depois de perguntar o que passava e de conversar 20 minutos com os manifestantes, só então é que uma mulher lhe perguntou se era ele. Boyd Rice sublinha o facto de que as pessoas se manifestam por moda, sem terem qualquer noção do objecto da sua raiva – neste caso ninguém cobhecia os seus discos nem a sua magem; e mais grave é que essas pessoas não o sabem nem o querem saber – senão, como é que poderiam vociferar o seu ódio cego. Mostram assim que a falta da verdadeira informação na nossa sociedade só contribui para um estado de ignorância gritante.Boyd afirma que seria fácil manter-se agarrado aos discos bem sucedidos do passado – é um músico não-músico em trânsito, que pretende para os seus trabalhos um grau permanente de evolução. Fazer outro MMM ou outro Scorpion wind, por muito tentador que seja ou somente pelo prazer renovado de criar um disco com tantos temas fortes, não se encontra nos planos de Boyd Rice. Não obstante esta tendência de não repetir fórmulas comerciais ou passíveis de causar maior impacto junto dos públicos mais específicos a que se destina, Boyd tem conseguido provocar um impacto notável junto de alguns círculos culturais na Europa – desde há algum tempo que o circuito das palestras em universidades ( logo ele – um auto-didacta que deixou a escola no ensino secundário!), das prelecções em círculos gnóstico-herméticos ou simplesmente de orientação esotérica, é percorrido por este americano nascido na Califórnia nos anos 50. Surpreende-o também a dedicação dos fãs que acorrem aos concertos de entrada limitada, vestidos a rigor com a habitual militaria; no entanto este aspecto superficial não é obstáculo à comunicação. São pessoas inteligentes e cultas com quem se pode ter uma conversa interessante e construtiva, ao contrário do que muitos pensam. Por asim dizer, os aftermaths dos concertos de Boyd Rice mais parecem seminários universitários, em todos tem uma palavra a dizer ao mestre de cerimónias, ou porque investigaram este ou aquele pormenor histórico ou mitológico, ou porque têm uma dica de investigador a fornecer a quem os inspira. Olhando para trás, não há dúvida que os Throbbing Gristle e os Cabaret Voltaire no Reino Unido e Boyd Rice nos estados Unidos, foram os principais pioneiros da cena industrial nos meados dos anos 70; Boyd Rice relembra que antes de ouvir os Throbbing Gristle já conhecia Genesis P Orridge, porque ambos se movimentavam nos mesmos círculos artísticos de vanguarda ( algures entre o dada e o futurismo de Marinetti); da primeira vez que visitou Londres, Boyd visitou o mentor dos Throbbing Gristle e mostrou-lhe algumas das suas gravações; espantado, Genesis virou-se para ele e exclamou – “ Isto é muito industrial, Boyd!”. Provavelmente ambos ficaram surpreendidos.Outro motivo de surpresa, mais recente, prende-se com o facto de muitos dos seus detractores o acusarem de ser uma contradição ambulante – isto porque nas suas preferências musicais não se cansar de referir os nomes que nos anos 60 e 70 fizeram as delícias do easy listening, da pop ligeira despreocupada –gente como Lee Hazlewood e Nancy Sinatra, os Carpenters, a Partridge Family, o chefe de orquestra havaiano Martin Denny, Serge Gainsbourg, etc. Boyd acha que a influência é sempre indirecta, não se reflecte ao nível das composições. Todos esses músicos e cantores o influenciaram na sua adolescência, até hoje; de resto, mantém todo o seu entusiasmo quando descobre uma antiguidade que valha mesmo a pena, e aí é como um cristão renascido – Já viram isto ?! Têm que ouvir isto!, uma faceta da sua personalidade que é mais forte que ele e a qual não consegue evitar. Para além disso, está bastante ligado à lenda de Lee Hazlewood – não só em tempos foi convidado para o representar num projecto de filme entretanto abandonado, como também recentemente fez a narração off para um documentário sobre a vida do grande compositor popular norte americano. Mas daí a haver o também a dedicação dos fãs que acorrem aos concertos de entrada limitada, vestidos a rigor com a habitual militaria; no entanto este aspecto superficial não é obstáculo à comunicação. São pessoas inteligentes e cultas com quem se pode ter uma conversa interessante e construtiva, ao contrário do que muitos pensam. Por asim dizer, os aftermaths dos concertos de Boyd Rice mais parecem seminários universitários, em todos tem uma palavra a dizer ao mestre de cerimónias, ou porque investigaram este ou aquele pormenor histórico ou mitológico, ou porque têm uma dica de investigador a fornecer a quem os inspira.uma contradição entre fazer música industrial e gostar de pop ligeiro, só se for na cabeça de quem o afirma. uma contradição entre fazer música industrial e gostar de pop ligeiro, só se for na cabeça de quem o afirma.Qual será o disco favorito de Boyd Rice na sua discografia? Boyd não faz escolhas mas sublinha apenas o valor intrínseco de cada disco que fez, e que reflecte uma passagem da sua vida e carreira – dos mais recentes, destaca claramente Children of the Black Sun, especialmente a versão 5.1 ; depois cita os momentos iniciais de música ambiental que gerou em pleno pós-vietname nuns Estados Unidos culturalmente a tentar renascer; por outro lado não pode esquecer MMM , um disco que lhe trouxe milhares de amigos em todo o mundo, talvez porque tinha a coragem de dizer aquilo que muitos pensavam sem abrir a boca. Uns achavam que ele era apenas um tipo com piada, com um imenso sentido de humor negro e cruel, outros viam-no como uma espécie de mentor ideológico. A propósito de humor nas páginas do diário de digressão europeia de 1998 com Albin Julius e Der Blutharsch, Boyd Rice demonstra sem sombra de dúvidas que é um grande comunicador, dominando a arte de literatura de viagem, com os ingredientes comme il faut – precisão, concisão, interesse e um grande sentido de humor. Continuar a escrever nessa veia é um dos seus objectivos, até porque a secção livreira da britânica Creation vai editar no próximo ano uma selecção de todos os seus escritos mais ou menos humorístico-misantrópicos, algo que vai concerteza ter muita procura nos escaparates. Com todos estes atributos de intervenção cultural, não será por acaso que a figura de Boyd Rice ganha um estatuto de quase homem da nova renascença – às vezes acha que sim, embora o diga em tom jocoso, numa pompa afectada de blague. Mas pensando bem, Boyd abriu recentemente um bar Tiki ( cultura primitiva havaiana à mistura com o kitsch americano dos anos 50), e doravante cada vez que se lá entrar será como entrar no sonho de Boyd Rice – por si, passaria lá anos se fosse possível. Para homem da nova renascença, não está mal, só que aqui a gnose mistura-se com cocktails exóticos. Se forem a Denver e gostarem da música exótica de Martin Denny, procurem-no.De volta às temáticas hermético-gnósticas e ao objecto principal desta 4ª vinda a Portugal, o livro The vessel of God, Boyd revela uma nova faceta nos seus escritos esotéricos que se intensificou desde que se afastou da revista Dagobert’s Revenge, que liderava com a jovem jornalista sua compatriota Tracy Twyman, que segundo ele próprio, se revelou uma desilusão, algo paranóica e de pouca confiança. Na revista, por diversas vezes foi abordada a enigmática figura do cineasta e artista generalista francês Jean Cocteau, alegadamente um dos grão-mestres do Priorado de Sião, como de resto em 1982, meio mundo ficou a saber, depois do lançamento do livro Holy Blood Holy Grail. Jean Cocteau é uma das obsessões na vida de Boyd Rice, ao ponto do seu último disco ser-lhe inteiramente dedicado. Para começar, os seus filmes estão carregados de toneladas de simbologia hermética disfarçada de surrealismo tardio, e sabendo-se hoje em dia um pouco mais que na altura em que certos filmes foram assinados pelo mestre, então a motivação para os esquadrinhar ainda é mais forte. Uma coisa leva a outra e por extensão lógica, falou-se do mistério de Rennes le Chateau, que também é abordado levemente em The vessel of God e sobretudo do popular romance que parece ter açambarcado a atenção global Boyd falou-nos das suas impressões sobre o livro de Dan Brown, e mesmo perante as nossas insinuações de que talvez não passasse de pulp gnóstico-hermético de pacotilha, afirmou ter gostado do que leu. Aliás, apenas o livro porque alguém disse que deveria verificar os seus conteúdos, que só vinham confirmar os seus artigos na Dagobert’s Revenge – facto que pôde constatar com muito agrado. Quanto à Ordo Lapsit Exiilis, um think tank projectado pela trupe à roda da revista, e não por Boyd Rice, já não existe. Segundo ele, tudo não passava de um grande embuste, em que mediante o envio de 100 dólares, qualquer pessoa poderia passar a ser membro de uma ordem esotérica. Nem diria, julgando pela linguagem articulada de fino recorte jornalístico de Tracy Twyman, que tudo acabasse desta maneira tão canalha. Até a célebre Cruz de Lorena, que Boyd de certo modo estilizou, era vendida pela net ao preço de uma pequena fortuna. Todo este sórdido imbróglio leva-nos à nossa última questão para Boyd Rice, neste esplêndido final de tarde de Outono na esplanada da Quinta da Regaleira – o seu manifesto interesse nos cavaleiros templários e na sua presença em Portugal. Em 2002, aquando da passagem por Colares do colectivo Wolfpact minus Albin Julius, os organizadores levaram Boyd à Regaleira onde se encontram inúmeros motivos neo-templários, e a partir daí Boyd ficou absolutamente admirado pelo facto de ninguém dos seus conhecimentos lhe terem falado em tal local. Quando mais tarde os confrontou com as páginas virtuais do site da Regaleira, as reacções de “Oh My God!!” foram unânimes. A partir dessa altura, o nosso país passou a ser paragem obrigatória para Boyd Rice.Coube-nos a honra de podermos entrevistá-lo.



Wermut – "Les cinq-a-sept post-néoistes" (Old Europa Café, 2004)

A anos luz das aventuras surrealistas dos Novy Svet e dos His Divine Grace, parece que eram apenas as 4Luas que desconheciam os austro-húngaros Wermut, onde também participa Jürgen Webber. Já que é assim, aproveitámos para repor o seu 1º mini lp em dez polegadas "Les cinq-a-sept... etc", uma vez que depois dele já saíram mais dois álbuns, "Hoffnung" e "Anna". Sempre que Jurgen ou His Divine Grace colaboram em qualquer projecto, é certo e sabido que se pode esperar algum surrealismo acompanhado de poesia em espanhol-dada; na estreia dos Wermut lá encontramos aquela constante vacilar determinado entre ambientes cabaret post- miserabilista-desgostista e momentos de um surpreendentemente enérgico e inspirado folk viajante. Para culminar o efeito, sublinhe-se a ediçao em vinil dez polegadas branco assim como as habituais capas abertas "de par em par" da Old Europa Café ( um label que vale uma civilização...) .